Grande parte das perguntas da filosofia é destinada ao campo da ética, da moral, dos valores que definem nosso agir no mundo, na sociedade, com o outro e conosco mesmo.
Na Grécia antiga, antes do período clássico, o homem se organiza e age baseado em princípios míticos, e acredita que sua vida é comandada por deuses, no alvorecer da filosofia, lá pelos sécs. VII e VI a.C, filósofos como Tales de Mileto, começam a fundar valores baseados na observação da natureza, ou seja, buscam nas leis da natureza, os fundamentos da moral. A harmonia da natureza deve ser seguida pelo homem no seu agir no mundo.
Mas, com Sócrates, no séc. IV a.C., o homem começa a ser o centro dos valores morais, ainda não é o individuo como conhecemos hoje, mas, é a primeira noção de individualidade. Foi com os sofistas que a moral começou a se deslocar do âmbito da natureza, da organização natural, representada politicamente pela polis e a ideia de cidadão, e passou a ser uma “medida do homem” (Protágoras e Górgias), aqui já se vislumbra claramente o individuo separado do todo, tanto da natureza, quanto do conceito de polis, cidade-estado, grego.
Na idade média o cristianismo exacerbou essa centralidade do homem e transferiu-o de vez para o centro de qualquer valor a ser desenvolvido, quando definiu que o homem era a imagem e semelhança de Deus, e apoiado na teoria platônica das formas. Platão, que dizia ser o conhecimento uma reminiscência da alma, trazida do mundo das formas, foi resgatado por Sto. Agostinho, através do neoplatônico Plotino, e foi a base de toda a Patrística, corrente de pensamento que predominou do séc. III até o séc. XII.
No entanto, com isso fez uma cisão entre corpo e alma e os valores antes centrados na polis, no cidadão, tomaram uma direção mais individual, pessoal, era uma questão de seguir as regras do cristianismo, o exemplo de deus. Houve uma significativa mudança quando Sto. Tomaz de Aquino resgatou Aristóteles e consolidou a Escolástica que perdurou até o séc. XIV, ele buscou conciliar esta cisão entre deus e homem, alma e corpo, através da razão.
No fim da Idade média, lá pela primeira metade do séc. XVII Descartes inaugura o pensamento instrumental, racionalista, que separa definitivamente corpo e razão (alma). Deus está afastado do mundo, ele não mais intervém na natureza, não determina os caminhos do homem, ele agora é livre, na esfera do mundo, dessa forma, novamente os valores humanos sofrem modificações, o corpo já não é sagrado, é tratado como simples instrumento, a razão é centro, a “coisa que pensa” é tudo que resta, a única certeza da existência humana, o único elo com deus, o corpo é reles matéria, falho, fraco, impreciso, máquina biológica que serve a toda poderosa razão humana.
Esse pensamento perdura e se fortalece. O homem cada vez mais busca tomar posse do que é seu. Não mais por dadiva divina, mas, por que a sua superioridade racional exige isso, o homem é o senhor da natureza. Ele pode e deve mapeá-la, a razão pode destruí-la e construí-la, basta que a apreenda, compreenda. A razão é senhora absoluta do universo.
Copérnico, Newton, Galileu acendem as luzes a Europa se levanta iluminada pelo humanismo exacerbado, a revolução industrial projeta esse homem separado da terra, da natureza, capaz de a tudo criar ou recriar. Nasce o homem moderno e seus valores egoístas e mecanicistas, mas, somente até que as bombas atômicas da segunda guerra mundial sobre Hiroshima e Nagasaki, o massacre de judeus, os massacres na África pós-guerra, Coreia, Vietnam, o aquecimento global, a camada de ozônio, a crise do petróleo, a guerra-fria, Tchecoslováquia, Iugoslávia, Bósnia, Chechênia, Guerras do Golfo... vieram nos dizer do contrário.
É a crise dos valores, a pós-modernidade, a ressaca tecnológica... O sec XX é marcado pela negação da modernidade, a ciência é colocada em cheque, a tecnologia é fútil, belicosa, direcionada a economia e não ao homem. Em vez de libertar o homem da servidão, aliviar sua carga de trabalho, cada vez mais o acorrenta, aumenta suas necessidades e o obriga a trabalhar mais e mais, diminuindo seu tempo de lazer, de convívio familiar e social.
A violência explode gratuita, sem sentido e sem direção, preconceitos, racismo, etnocentrismo, intolerância... Não há mais um conjunto de valores capazes de guiar a humanidade, o mundo ouve a palavra globalização, acenam com uma ideia de aldeia global, palavras como ecologia, tolerância, dialogo, preservação passeiam nas telas de TV, nas paginas de jornais e nas ondas de rádio... Nações se organizam em blocos MERCOSUL, UE, ALCA, OTAN, numa tentativa de garantir segurança e barrar a violência irracional que permeia o nosso mundo atual.
Herdamos um mundo carente de valores básicos. Segundo Habermas, o utilitarismo é o que move a nossa ação hoje, o que justifica a ação humana é utilidade: o certo é o que se busca a felicidade, que contribui para a obtenção da felicidade. Ou seja, como nos diz o utilitarismo, felicidade é a ausência de sofrimento. Essa herança pós-moderna é cruel com a criança, com o jovem, visto que o coloca sozinho no mundo, a mercê de “babas eletrônicas” e valores virtuais, abstratos, irreais. O contato humano é mínimo, não existem vínculos reais, a comunicação é intensa, no entanto, virtual e impessoal. Se por um lado temos o conforto dos aparelhos e a segurança dos condomínios, por outro perdemos a capacidade de nos emocionar com o outro, de chorar e sorrir, de sonhar. Não há mais respeito e nem tolerância, pois não nos tocamos, não nos sentimos. Observamos através das telas, captamos através das câmaras. Ouvimos e lemos, não convivemos! Aliás, sequer vivemos...
Eu, particularmente reconceituei o respeito e fiz dele o principal valor para basear meu agir com o outro. Nessa minha conceituação, respeito significa ver o ser humano como igual, seja ele de que cor, raça, sexo, cultura, nacionalidade, posição social, econômica, politica, intelectual. Enfim, qualquer ser humano deve ser olhado de frente e no mesmo nível.
Manoel N Silva.
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