Eu não consigo entender e pensar a Filosofia sem
uma atuação intensa e significativa no ambiente acadêmico e fora dele. A
Filosofia quando vem a cabeça das pessoas não vem como introspecção e sim como
reflexão. E, como tal, não pode dissociar-se do debate, da discussão e do
confronto dialético das ideias.
Não é uma questão de política, é que é da
"natureza" da Filosofia, desde os pré-socráticos, essa atuação, esse
protagonismo do filósofo. O filósofo é o interprete da realidade, aquele que
dissipa a fumaça da ignorância e vai a Ágora, mostrar com seu discurso, essa
realidade, tal qual Sócrates. Ou quebra as amarras e saí da Caverna e se
encontra com o real e o apreende, voltando para libertar sua gente, cumprindo a
sua missão platônica.
A Filosofia só se recolheu no período helenístico,
quando surgiram as filosofias introspectivas, pessoais e distanciadas da polis,
como o caso do epicurismo, em todos os outros períodos históricos da filosofia,
em todas as suas correntes, ela se dá no discurso, na atuação, no debate público,
na busca mediada dos problemas gerais da humanidade.
Não é o debate político que se cobra do filosofo, é
o debate simplesmente. O debate como a práxis filosófica. E isso, necessariamente
não é filosofia política, mas, não há como separá-las, a política é base
fundamental nas relações humanas, portanto, sendo a filosofia a base da
compreensão humana da realidade, elas se irmanam simbioticamente em suas
atuações.
Tudo bem, toda atuação profissional é sim política
e, é ato, ação, práxis. Mas no caso especifico do filósofo, ele não é um
simples profissional, um técnico que vai contribuir com a sua ação apenas se
dedicando ao estudo dessa ou daquela área da filosofia, a práxis filosófica é o
discurso, o debate das ideias. A problematização e a resposta a esses
problemas. É isso que se espera de um filósofo, seja qual for a sua área de
estudo. Essa é a visão do povo do que seja um filósofo e é isso que ele espera
dele. Ou seja, que ele pelo menos vá ao corredor, ao jardim, ao pátio... Ele
tem que sair da sala, da biblioteca, do quarto de estudos!!!
Não é que eu defenda necessariamente uma atuação
política do filosofo e nem muito menos coloco o ser humano como necessariamente
um ser político. O que coloco na minha "tese" é simplesmente uma
atuação do filosofo na sociedade em que ele se insere, e como tal, essa atuação
não é necessariamente na área política, apesar de que, fatalmente, ela será um ato
político.
Portanto, os problemas mais urgentes e não efêmeros,
só podem ser pensados com uma práxis
filosófica, e assim se dando, necessariamente o filosofo terá uma ação
política. Em um momento de crise como este em que vivemos, a sociedade clama
pela atuação da filosofia. Nesse momento é que o filosofo tem que atuar
politicamente, ele precisa sair da caverna e ferir os olhos com a luz da
realidade...
Porque é que os alunos cobram tanto a atuação
política do filosofo e, provavelmente isso se refira mais especificamente aos
professores? A meu ver, a maioria dos professores de filosofia, não atua fora
da sala, no âmbito dos corredores, do pátio, da cantina, etc...Eles restringem
a sua atuação a eventos formais, onde os alunos, sedentos de debates e ação,
não podem livremente colocar suas ideias. Os professores acreditam que não
precisam ir além dos seus deveres curriculares, suas palestras e seus eventos
formais. E até concordo que estão certos sob seus pontos de visão.
No entanto, a imagem que os alunos têm da filosofia
não é esta. A filosofia no mundo dos alunos é aquela que se mostram nos manuais
de filosofia do ensino médio. Romântica, idealista e a mãe de todas as
ciências.
A história da filosofia que é contada no EM está
repleta desse idealismo e desse protagonismo político, Montesquieu foi conselheiro do parlamento de
sua cidade... Aristóteles foi conselheiro de Alexandre, além de o seu próprio
modo de ensinar já atenda a reivindicação dos alunos de hoje; Maquiavel nem
precisa falar, Locke foi ministro de William III de Orange...etc. Mas, não é
uma questão de militância política
simplesmente, é uma questão de viver a realidade e usar essas ferramentas que
são bem mais "afiadas", nas mãos dos filósofos. Tal como nos fala a
crítica platônica ao sofismo, o filosofo tem a capacidade de esclarecer sem
enganar, sem precisar sofismar.
Não que eu seja contra os Sofistas, muito pelo
contrário, apenas uso a teoria a minha disposição para fazer-me entender em
minhas colocações. Eu não vejo os sofistas como os viu Platão ou Aristóteles. Na
minha visão e análise do que me chegou deles, eles eram esses filósofos que os
alunos desejam.
Concluo esse pequeno desabafo dizendo que não quero
lhes convencer a mudar e nem impor minhas convicções, apenas debato essas
ideias que constroem meu arcabouço intelectual, no interesse do conhecimento
que posso adquirir. Nada me impede que amanhã eu mude de posição e reveja esses
conceitos, e quem sabe pode até ser uma frase qualquer, uma colocação trivial que
alguém me faça, a causa dessa mudança. Como livre pensador que sou, estou
sempre aberto!
Mas, me estenderei um pouco mais para dizer que uma
coisa é certa, a situação está feia por aqui, temos que agir e reagir. O
discurso da tolerância, da isenção, da conciliação serve, nesses casos, apenas
para mascarar as reais intenções daqueles que desejam, à custa de uma suposta
liberdade de expressão, disseminar o preconceito, o racismo, a opressão das
minorias e sufocar os gritos dos injustiçados. Precisamos sim, sair desse
marasmo político, atuar concretamente nas ruas, nas escolas, nas fabricas e
ambientes públicos. Precisamos nos contrapor a onda reacionária que ensaia se
tornar maremoto.
Por isso digo a esses alunos que anseiam por uma filosofia
que seja o grito dos sem voz e vez: Estamos tentando, mas a resistência é
grande, afinal são mais de trinta anos que a Filosofia ficou acorrentada no
âmbito da academia, presa as pesquisas, aos estudos solitários, longe da praça pública,
no máximo ia ao auditório...demora mostrar que a Filosofia é sinônimo de
autonomia, liberdade, abertura de horizontes, pluralidade de ideias.