domingo, 28 de novembro de 2010

SOBRE A SOBREVIVÊNCIA DO CAPITALISMO.


        Não existe liberdade na anarquia. O ser humano busca harmonia, ordem, sentido. Não existe sociedade sem estado e nem estado sem sociedade. Tanto Marx quanto Hegel, tem razão e estão errados. Se Marx anseia pela supressão do Estado, Hegel visa a superação da sociedade. Nenhum chegará a lugar algum. Sociedade e Estado são um e uma única coisa. Qualquer evolução na moral humana tem que acontecer dentro desse movimento dialético das relações sociais e políticas.

         Marx não ignora a liberdade, muito pelo contrário, a liberdade está na auto regulação, na autogestão da sociedade. O comunismo como imaginado por Marx, é a realização da liberdade, a objetivação do homem a verdadeira universalização. Assim como o Estado para Hegel é absoluto. No entanto, não se pode separar estado de sociedade. Esse é fundamentalmente um erro de Marx, ele entende a sociedade como relação produtiva e não como relação afetiva, emocional. Ele faz da sociedade (relações de produção), o que Hegel faz do Estado, só que Hegel concebe uma teleologia, um fim em si mesmo para o estado. O trabalho em Hegel é um mediador, para Marx é um fim.

         Marx concebeu o trabalho do "comunismo" com o único fim de suprir a necessidade. A sociedade é mera relação e não realização do homem. O homem se realiza no trabalho. As relações produtivas são as bases da sociedade e todas as outras são derivadas delas.

          Marx pode até está certo, sua análise histórica é brilhante, concordo, sua visão do todo é clara e ele captou com maestria a essência do capitalismo. Porém, é no momento de projetar um futuro, de conceber uma nova visão de mundo, que ele, como todo e qualquer teórico, parece esquecer que não se muda uma sociedade e sim o indivíduo. Um coletivo não tem consciência, não tem subjetividade, não age por si mesmo, não atua por si só. Não existe coletivo, universal sem individuo, e não existe individuo sem individualidade, singularidade, particularidade, desejo e vontade. Não se muda uma cultura sem aniquilá-la, exterminá-la.

             Para que houvesse uma mudança nas sociedades seria necessário, não simplesmente a classe operária tomar o poder, seria necessário aniquilar todos os remanescentes do sistema anterior e exterminar todos os seus rivais e simpatizantes. Como fizeram os colonizadores da América com os Astecas, Maias e Incas. Com os índios brasileiros e os americanos. Não se impõe uma cultura "naturalmente". Não se substitui uma sociedade apenas com uma revolução que tome o poder. É necessário dizimá-la.

             E, acredito que Marx sabia disso, tanto que propôs um período de "transição" que seria a "ditadura do proletariado", ou seja, o tempo necessário para que todos os inimigos do sistema fossem eliminados. Por isso todos os sistemas baseados nessa ideologia fracassam. Não se pode matar em massa na conjuntura mundial de hoje. O mundo não é o mesmo de 600 anos atrás.

           Como diria o meu caro amigo Marco Aurélio, profundo conhecedor de Marx e admirador de sua filosofia: Apenas uma bomba atômica, um caos total e generalizado que eliminasse toda e qualquer organização social, política, econômica e cultural, seria capaz de dar ao mundo (ou ao que restasse dele e se restasse) as condições necessárias para uma nova organização social e produtiva do homem.

           No meu entender, existe algo que todos devem ter percebido claramente e se não perceberam deviam perceber e compreender: não se pode prever o futuro. Podemos baseados em indícios, análises das condições, tendências, projetar uma possível reação futura. E nada mais. Por isso, não adianta o filosofo, economista, cientista político, social, pensar uma reforma do mundo e projetar isso como uma realidade concreta, certa e possível. Somos seres de vontade e vontades diversas, conflitantes, antagônicas.
          
           As mudanças só se dão diante da inevitabilidade, da necessidade indiscutível e não dos desejos e das vontades. Todos os seres humanos, com certeza desejam um mundo melhor, uma sociedade mais justa e harmônica, essa indubitavelmente, deve ser uma vontade universal. Todos querem ser felizes e viver bem, com qualidade, conforto. O problema é que para que todos realizem esses desejos universais, temos que passar cada um de nós, por necessidades particulares. E, cada indivíduo tem que satisfazer necessidades diferentes para realizar esses desejos universais.

          Portanto, como sugere Maquiavel, para se manter no comando e garantir uma certa harmonia, os governantes precisam ter "virtú", ou seja, conhecer a realidade e a história e se preparar para mediar o que a deusa "fortuna" nos trará, pois homem nenhum, por mais sábio que seja, e por mais conhecimentos que tenha, será capaz de prever o futuro. No máximo antecipar efeitos que as causas presentes e passadas lhe apontam. E ai sim, terá certa vantagem sobre os demais. É assim que acontece com o capitalismo, como sistema econômico, não projeta um futuro, constrói a partir das suas experiências e, conforme suas necessidades vão surgindo, ele vai se adaptando, mediando, ajeitando-se, aqui e ali, sempre nesse movimento, na iminência de ruir e sempre se superando.

         Diferentemente do que deseja o relativismo, a solução não parte da tolerância, da solidariedade, eu penso que a solução se dá, necessariamente pela economia (e aqui me aproximo de Marx), por que apesar dessa exploração do individualismo, do egoísmo natural do ser humano, pelo capitalismo, e talvez por isso mesmo, ele é sem dúvida, autofágico. Não há como negar a tendência do capitalismo de auto se destruir. No entanto, também é inegável a sua capacidade de manutenção e adaptação as condições adversas criadas por ele mesmo. O capitalismo que fala Marx, por exemplo, nem de longe é o capitalismo de hoje. O capitalismo de hoje sobreviveu as duas grandes guerras, a guerra fria e ganhou, em diversos países, nuances socialistas, afastou-se do liberalismo, e se equipara ao comunismo stalinista, com estados gigantes e políticas paternalistas, assistencialistas.

                Se observarmos a conjectura atual, perceberemos que a tendência mundial da economia é para uma efetiva globalização econômica (os blocos econômicos, as associações internacionais de comércio, etc), para isso, se faz necessário, também, certa globalização social e política. Ou seja, para que o capitalismo sobreviva e certamente sobreviverá, as sociedades e as culturas se integrarão, as diferenças diminuirão e certamente haverá certa harmonia mundial. No entanto dado ao caráter, já enfatizado, da autofagia do sistema capitalista, fica impossível supor uma estabilização, um equilíbrio entre pobreza e riqueza, trabalho e exploração.

         De qualquer forma, Marx não previu em que época se daria essa implosão do capitalismo, portanto seus discípulos continuarão, século após século, a adorar e, a cultuar essa previsão. A minha pergunta é, se isso acontecer, qualquer sistema que surgir a partir dessa implosão, não será uma metamorfose do próprio capitalismo?

Manoel N Silva

domingo, 31 de outubro de 2010

DILMA PRESIDENTA DO BRASIL...




Que motivos levaram nosso povo a escolher a continuidade da politica de Lula, tão marcada por corrupção, escândalos e programas sociais de caráter assistencialistas?
O que a oposição ofereceu em contrapartida a isso?
Nada. O mesmo discurso, essa verborragia que a oposição, sem nenhuma criatividade política, veio repetindo durante estes oito anos...
Será que eles acreditam que o povo não tem conhecimento do que acontece e aconteceu nesse governo de Lula, que ele precisa dessa “esclarecedora luz” oposicionista, dessa política de comadres, que se fundamenta em boatos e dossiês?
O povo está escolhendo a Dilma, não porque ela seja o suprassumo da competência e probidade, e nem porque o Governo Lula tenha sido a oitava maravilha, mas, sim porque infelizmente, o que a ele foi oferecido, no lugar de Lula e como opção a ela, é o retrocesso! Oferecem ao povo brasileiro aquilo que ele, há oito anos atrás, descartou, e há quatro anos confirmou e sedimentou o descarte.
Infelizmente a oposição se perdeu na fumaça de seus fogos de artificio e esqueceu-se de forjar alternativas reais, que apontassem uma verdadeira mudança para os rumos da economia, da política e da ação social.
A apelação ao debate religioso foi simplesmente ridícula. O Estado brasileiro é laico, assim sendo, a discussão religiosa está restrita ao âmbito da religião e não da política. Governantes não podem estar presos a dogmas religiosos e defenderem posições, que embora sejam condizentes com uma fé pessoal, venha a prejudicar uma parcela da população.
Nada tenho contra que as religiões defendam a não legalização do aborto, mas um Chefe de Estado, não pode fechar os olhos para as mortes evitáveis de meninas e mulheres que, apesar da criminalização, buscam clínicas clandestinas, sem nenhuma estrutura, para realizarem abortos. Essa realidade não pode ser negada em nome de crenças religiosas. Esse problema deve ser discutido do ponto de vista da saúde, da mulher, do respeito à vida, num amplo debate social, mas, jamais por imposição de um dogma religioso, baseado em princípios milenares, forjados em uma época que a rude medicina que existia, nem sequer imaginava a biologia, a genética, ou os conhecimentos sobre a vida que hoje temos.
O que a oposição ao PT e a Política do Lula, parece não ter enxergado, é que o perigo não é o PT e Lula, sua ideologia, seu8s anseios de poder, mas a falta de oposição, ou melhor, a estupidez da oposição que não soube construir alternativas de poder. Não ofereceu resistência real ao avanço ideológico do PT.
Outro erro é a falta de consistência dos partidos de oposição, PSDB e DEM, (cito esses dois apenas, porque os outros, sequer podem ser chamados de partidos, pois são meras associações de minorias e defendem interesses particulares. Parecem mais ONGs do que agremiações políticas) seus membros atuam individualmente, cada um com seu interesse, não há coerência ideológica, nenhum compromisso partidário. Esses partidos são meros instrumentos jurídicos que possibilitam a eleição. A associação partidária é mera conveniência, necessidade legal.
Por isso, o PT, por mais que tenha sido exposto, e seus membros desmoralizados e desmascarados; envolvidos em escândalos de corrupção, dólares nas cuecas e malas de dinheiro, continuou firme, pois, sua espinha dorsal, seus pilares políticos ideológicos, suplantam os indivíduos que o formam.
Gostaria de ver, nesses próximos quatro anos, um PT renovado, de cara limpa, capaz de apagar da nossa lembrança, as imagens e as manchetes que derrubaram mitos e homens, destruíram heróis, pessoas que nos serviam de exemplo... Como seria bom voltar a ter o orgulho de usar no peito aquela estrela vermelha, abrir um sorriso largo e voltar a ter esperança...  
Bem, temos mais quatro anos de governo Petista... Espero que, para o bem desse país, que os políticos eleitos, essa nova geração que se mescla a já existente, não se deixe reger por ideais tão vazios e inúteis quanto esses que essa oposição apresentou a esse país. Tomara esses políticos novos, consigam formar pelo menos um partido político com cabeça tronco e membros. Que seja capaz de articular uma oposição programática, consciente e firme, que tenha visão política e que equilibre o jogo democrático, para que a alternância de poder possa acontecer sem medos, sem sustos e sem retrocessos. 
Também não vou me alongar em críticas que não levam a lugar nenhum. Não fiz e, nem faço uma defesa da atual política do governo, nem tampouco me coloco em posição de ataque a qualquer posição política, seja de esquerda, centro ou direita.  
O que inicialmente quis colocar foi a minha visão crítica do atual momento político brasileiro, marcado por uma apática oposição que não demonstra qualquer definição programática em seus discursos e que, em contrapartida a isso, existe um partido politico organizado, definido ideologicamente e com um projeto de poder articulado, no poder.
Diante disso, não vejo a necessidade de fazer pirotecnias e acusações falsas, forjar dossiês e inventar ligações conspiratórias. Na minha simplória visão, bastaria que os opositores ideológicos do PT, se organizassem politicamente em partidos definidos ideologicamente e com projetos de poder claros, programas coerentes e que seus membros fossem fieis a tal. Ou seja, que a oposição mostrasse uma opção real e suplantasse essa política pequena, mas não ineficiente, que o PT oferece.
Repito, pequena, mas não sem sentido, sem rumo e sem proposito. O PT tem um projeto político e suas ações são coordenadas e seguem o programa oferecido e aprovado pelos eleitores. Se esses eleitores não estão conscientes dessa escolha, cabe a oposição mudar isso. Mas, não com simples fogos de artifícios, apelos religiosos e invenções conspiratórias. Muito pelo contrário, deve fazer isso com racionalidade e coerência política, com opções claras e reais, e acima de tudo, competência! Essa que tanto foi aventada pela oposição e em nenhum momento demonstrada na sua proposta de renovação.
Adoraria ver os nossos políticos discutindo problemas reais e a imprensa desse país, servindo ao esclarecimento, ao desenvolvimento crítico do nosso povo, numa postura independente e livre, e não tomando partido por essa ou aquela ideologia, por esse ou aquele governo. Se prestando a maquiarem noticias e inventarem fatos de maneira grotesca.
Isso é tudo que tenho a dizer, espero que possa ser entendido. Não estou me posicionando contra ou a favor desses ou daqueles, meu único desejo é o de um país com clareza e definição política. Onde os brasileiros possam fazer suas escolhas conscientes e possam ver serem colocadas em prática as políticas do programa  que eles escolherem.

Manoel  N  Silva

sábado, 16 de outubro de 2010

DIÁLOGO VIRTUAL II



 RAZÃO: valor ou instrumento?

YEDRA
“A Razão nasceu como um valor enquanto "Logos", passou a ser instrumento no período medieval, voltou a ser um valor no início da modernidade, e na nossa contemporaneidade, novamente passou a ser um instrumento." (?)
Nos períodos em que a razão é um valor mais do que um instrumento podemos dizer que ocorreu um avanço da liberdade?
MANOEL
Desenha aí para mim, não compreendi a razão como valor, nunca a vi ser tratada assim, sempre foi ferramenta, de menor ou maior valor, conforme a época, não?
YEDRA
A razão é um valor para o homo sapiens e um instrumento para o homo faber... pelo menos é assim que eu entendo a distinção.
Estou querendo chegar a Habermas... Você vai comigo?
LEO
A razão pode receber o sentido de valor, quando em determinado uso cultural do termo ela se aplica aos posicionamentos éticos. Valor tem sentido moral e quando a razão é colocada como o critério mais elevado de juízo moral, avançamos, como diz a Yedra, para uma sociedade mais justa por estar isenta de preconceitos, ideologias racistas e arbitrariedades.
MANOEL
Se conseguir acompanhar seu pensamento, vou sim, estou precisando me encontrar com Habermas, ainda não fui apresentado a sua filosofia, ao seu modo de ver a realidade...vamos lá!!!
Quando o homo sapiens se desvinculou do homo faber, ou pelo menos como se dá essa distinção?
LEO
Habermas é muito interessante, vai ser uma boa ajuda neste percurso de reflexão.
YEDRA
Habermas, seguindo a tradição da Escola de Frankfurt, da qual fazia parte, desenvolve uma outra modalidade de análise social, acompanhando o desenvolvimento crítico desta Escola. Ele faz a análise da sociedade industrial contemporânea, em termos de racionalidade, e destaca o fato de que neste tipo de sociedades impera a razão instrumental, ou seja, aquela que estabelece os meios para alcançar determinado fim. Esta razão é amplamente utilizada pela técnica e pela ciência em suas aplicações práticas. Ele trabalha suas ideias através da dicotomia que estabelece entre trabalho versus interação. Sendo que no âmbito do trabalho vigora a razão instrumental e as relações do tipo sujeito X objeto, enquanto na esfera de interação, que é o campo da comunicabilidade humana propriamente, as relações são se sujeito para sujeito.
MANOEL
Vejo aí uma volta a Hegel... Habermas parece querer ignorar, assim como Hegel ignorou as contradições existentes entre esses dois "sujeitos". Temo que a posição dele seja um regresso e não um avanço. Ele parece querer fugir do pessimismo do século, ignorando a realidade do sistema que, apesar de querer parecer separado do homem como sujeito, não é. Trabalho e sociedade são inseparáveis. Operário e sujeito são um só, homo sapiens e homo faber são abstrações, o que existe é o homem, sujeito das contradições nas relações com o mundo.
YEDRA
Concordo que o homem viva e aja em estado de complexidade, contudo dentro de suas complexidade, ele pode funcionar de modo mais direcionado e utilizar mais uma modalidade de racionalidade. Habermas insiste na importância da "razão comunicativa", como ele denomina o emprego da razão aliada à linguagem e que associa estreitamente "sujeitos falantes", que querem entender e serem entendidos. Ele afirma que o progresso técnico como meta geral da sociedade, apaga da consciência dos homens o dualismo trabalho e interação, o que acaba fazendo com que a evolução do sistema social pareça ser determinada pela lógica do progresso científico e técnico.
LEO
Entendo e concordo com a proposta de Habermas.
Quando confrontamos o outro com a possibilidade de uma comunicação fundamentada na razão, trazemos um "juíz isento" para o debate. Quer dizer que a razão deixa de ser meramente instrumental e passa a ser comunicacional, surge como norteadora do desenvolvimento humano. Todo posicionamento partidário, sectário e irreconciliável deve ceder diante do tribunal da razão, basta que as pessoas envolvidas no processo estejam dispostas a abrir mão desta postura irredutível. Quando em vez de dois disputarem por "ter a razão", ambos podem tentar alcançar a razão, aprendendo cada um com o caminho apresentado pelo outro na interação sujeito X sujeito.
MANOEL
Não serão as palavras, ditas de modo claro e compreensível, que vai apagar a realidade disso que ele coloca como simples aparência. Não podemos separar razão comunicativa de razão instrumental, ambas existem no processo. E "que a evolução do sistema social pareça ser determinada pela lógica do progresso científico e técnico." a sociedade contemporânea É determinada pela lógica do progresso cientifico e técnico.

E qualquer tentativa de pensar uma ética para esta sociedade tem que levar em conta esta realidade que do sistema capitalista.
Obs.: a referência ao sistema capitalista não é uma postura ideológica e sim simplesmente analítica.
LEO
Penso que a Yedra está enfatizando a diferença entre a razão comunicacional e a instrumental não por que sejam processos totalmente independentes, mas que a primeira concepção traz sua distinção por não ser de natureza manipulativa, característica que se pode associar à segunda.
MANOEL
Leo, a meu ver não existe essa possibilidade de um "juiz isento", não existe essa dualidade, a razão, assim como o homem é um só sujeito. Essa abordagem com a qual vocês me acenam parece uma conformação com o sistema, uma tentativa de separar o homem do trabalho, a sociedade da economia. Parece algo assim como dizer: Bem, o trabalho é sacana, injusto, mas aqui, na nossa privacidade social, podemos ser felizes e respeitar o outro...me soa tão hipócrita quanto, aquela antiga e milenar frase " à césar o que de césar...."
LEO
Manoel, Eu já não entendi desta forma. A razão não pode ser cindida, mas podemos descrever processos distintos que se fundamentem nela. Um é o processo instrumental manipulativo e utilitário, outro é o processo comunicacional espontâneo e gerador de desenvolvimento pessoal. A figura do "juiz isento" ganha o sentido de desempate argumentativo: eu digo A, tu dizes B, mas ambos estamos tentando descrever C, C é o "logos", o sentido último de verdade. Coloca tudo na mesma caixa que fica mais fácil de concluirmos que A + B = C. Tua fórmula é modular, seria assim: |A| x |B| = ?.
Não vi nenhuma hipocrisia na proposta, e a comparação com a frase milenar é esdrúxula, por que Jesus estava mesmo era acusando a hipocrisia do sistema, se a face de César está na moeda: "Dá a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus" por mais que certas coisas se misturem, elas não deveriam se misturar, um é o campo da política, outra é a seara da religião; um é assunto de fé, outro é objeto da razão.
MANOEL
Leo não são fórmulas lógicas que definem a realidade... A minha formula não existe, pois que ela é resultado da interação, da relação entre a e b, e não há uma resposta única para tal proposição, mesmo porque não há uma divisão clara entre a e b, não são dois campos distintos de atuação, da mesma forma que não posso dar "a césar o que é de césar", se é do suor do meu trabalho que vem a moeda...Do mesmo modo, meu caro Leo, não existem negócios de fé e negócios de razão, nem negócios de politica e de religião, tudo se entrelaça numa única concepção: o homem!

Qualquer filosofia, qualquer teoria que não leve em conta essa complexidade entrelaçada do ser humano, está fadada a ser mera teoria, sempre.
LEO
Concordo. Mas o simples fato de teorizarmos já se constitui em enquadramento acerca do assunto que estamos investigando. Ninguém pode ver toda a complexidade humana simultaneamente... Toda reflexão que fazemos implica em recortes da realidade que intentamos descrever. Precisamos dividir o assunto humanidade em diversos capítulos o que não quer dizer que sejamos capazes de capitular o Homem em toda a sua complexidade. As fórmulas são como nossas frases, nossas verdades proposicionais, servem apenas para ilustrar uma ideia, não têm a pretensão de esgotar a realidade sobre qualquer coisa, ainda menos quando falamos do homem!
MANOEL
Leo, pelo que consegui apreender do que a Yedra colocou, Habermas propõe um distanciamento da tecnologia e ciência, uma separação da economia e da política, do trabalho e da produção, da sociedade e do sistema. haveriam duas esferas de atuação humana a que abrangeria a economia e a produção ,que seria regida pela razão instrumental e a outra esfera reuniria os aspectos humanos política e trabalho, que seria norteada pela razão comunicativa. Sendo esta última esfera o mundo real do homem como sujeito, dessa forma ele encararia a outra esfera como mera necessidade instrumental, a produção e a economia como funções técnicas e mecânicas. Isso, a meu ver, é impossível, visto que essas duas esferas se entrelaçam de forma que dificilmente conseguiríamos distinguir uma da outra.
LEO
Manoel, Se sua apreensão estiver correta, concordo plenamente com suas conclusões....mas esperemos a Yedra mastigar um pouco mais esse negócio...
YEDRA
" Habermas propõe um distanciamento da tecnologia e ciência, uma separação da economia e da política, do trabalho e da produção, da sociedade e do sistema."
A questão da racionalidade é central em Habermas, o que ele propõe é a "reconstrução" do conceito e para tanto ele se coloca na perspectiva político-cultural para elucidar a relação entre teoria (saber teórico) e prática (atividade humana). No interior da sociedade coexistiriam os diferentes sistemas de ação, que compõem o que ele denomina de "mundo da vida". Ocorre que este "mundo da vida", que é a realidade inesgotável das vivências humanas, vai se tornando cada vez mais saturado de informações à medida que a sociedade vai se tornando mais técnica e especializada. Habermas nos acena com uma possibilidade de fuga e de crítica ao racionalismo instrumental, pelo caminho libertador da comunicação genuína.
MANOEL
Yedra, poderia  me colocar como esse "discurso" se aplica as relações de produção e consumo? Em que nível de participação e inclusão as regras de mercado participam desta comunicação ética?
Acho interessante, buscar um discurso ético, porém como ele se aplica a realidade, sem que para isso, seja necessário a relativização e a alienação de aspectos importantíssimos do sujeito, como as relações contraditórias entre trabalho como atividade para suprir as necessidades do sujeito e a ilusão consumista?
YEDRA
Dizer discurso ético significa associar uma consciência moral; e a consciência em seu sentido moral, vincula-se essencialmente ao outro; ela é de essência comunitária. Orienta-se menos pela vontade ou a razão do que pela emoção, o afeto, a pré-consciência comum ou mesmo o inconsciente coletivo. Este movimento de sujeito para sujeito, que envolve a "ação comunicativa", desaliena o homem de seu papel de "coisa" e o coloca em contato com uma rede de relações pessoais, condição esta que favorece a construção de uma consciência moral, fundamentada no outro "igual a si".
MANOEL
Sim, Yedra, isso é o mesmo que vejo na eticidade hegeliana, em vez de desalienar o sujeito , isso aliena mais ainda, pois que essa "ação comunicativa" é abstrata, tanto quanto o organicidade do estado hegeliano, e não aplicável a realidade humana, que tem sua "rede social", seu "inconsciente coletivo", " sua subjetividade" imanente as relações produtivas. E, não ao contrário, como sugere esta abordagem. O que vislumbro é, mais uma vez, uma tentativa "racional" de separar o inseparável. Se o pensamento moderno buscava separar "corpo" e "alma", razão e fé, esse pensamento contemporâneo quer, da mesma forma dividir, não mais o corpo e a alma, e sim a razão, em razão mecânica e razão social.
YEDRA
Por que é abstrata?
MANOEL
Porque é uma idealização, não há como conciliar esse discurso ético de valorização do outro, de respeito a pluralidade, etc., com a individualização presente e necessária no sistema de produção atual, essa "ação comunicativa" fica somente no interior de cada um( como o categórico kantiano e universalização do individuo no estado hegeliano), há uma compreensão disso, porém não há efetivação, pois a realidade é conflitante, paradoxal.
YEDRA
Se tudo que a Filosofia sugere e elabora são meras abstrações, então por que perdemos tempo com ela, não seria melhor limitar nossas leituras às obras de ficção?
MANOEL
A filosofia não é um deus, ela não se presta a criar uma realidade e, sim compreendê-la e a partir dessa compreensão proporcionar ao homem agir no sentido de mudá-la. A filosofia pensa a realidade, ela não cria a realidade, a realidade quem constrói é o homem nas suas relações.
LEO
Habermas não ajudou...
Mas pelo menos deu pra compreender que a razão pode ser tida como valor?

MANOEL
Eu acredito que como os valores são atribuídos pela razão, ela(a razão) será sempre instrumento e valor numa interação permanente e indissociável.
LEO
Então, é isso!
Esta pergunta "RAZÃO: valor ou instrumento?" nos estimula a pensar por que apresenta um aparente dilema, quando ficamos para escolher um OU outro, mas, na maioria das vezes, acabamos por demonstrar que é um E outro!
MANOEL,
Isso, não se pode dividir a razão, assim como não se pode separar corpo e mente!
As relações humanas se dão entrelaçadas, interligadas e interdependentes. Sociedade, trabalho, consumo, produção, política, economia também se entrelaçam e se relacionam na mesma proporção, pois são produto e produtores de relações humanas.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

THOMAS HOBBES, UM PENSADOR MALDITO

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            Para Hobbes os homens são potencialmente iguais, ou seja, a natureza os dotou com as mesmas capacidades. Todos possuem poder e força suficiente para que não possam triunfar uns sobre os outros. Mesmo que notadamente existam diferenças físicas, intelectuais, nenhuma dessas diferenças é suficiente para determinar a submissão e o domínio de um sobre o outro, pois que a experiência, a vivência e as condições a que cada um está sujeito, a astúcia, podem equilibrar as forças. Dessa forma, para Hobbes, o estado de natureza é aquela situação em que todos os homens têm total liberdade e, sendo eles todos livres para quererem tudo e tudo poder fazer, inevitavelmente chegam ao ponto de, dois ou mais homens desejarem a mesma coisa, e como todos são livres para dela se apossarem, e é impossível que todos dela se apossem, tornam-se inimigos e guerreiam pela posse.
Hobbes compreende o homem em estado de natureza, não como um selvagem. Portanto, o homem se relaciona, no entanto, o homem não é naturalmente um animal social, como coloca Aristóteles. Em Hobbes, o homem não sente prazer em conviver com outros, a associação se dá pela necessidade, o outro não é transparente, muito pelo contrário, é completamente opaco. Desse modo, o homem sendo de natureza egoísta, possuindo tendência natural para o domínio, esses pontos aliados a luta pela sobrevivência e preservação e mais ainda a vileza e o orgulho, em total liberdade, sem nenhum controle, só leva a um desfecho: a guerra generalizada de todos contra todos.
            Estando então o homem nessa situação, onde todos estão em guerra contra todos, e sem opções para desse estado sair, Hobbes procura vislumbrar, à luz dos conceitos de Lei natural (Preceito racional que proíbe todo homem de atentar contra a própria a vida ou privar-se dos meios para preservá-la ) e de Direito natural( que é a liberdade de fazer ou omitir e não a proibição), a saída. Levando em conta esta situação de impossibilidade de garantia de viver o tempo integral que a natureza lhe concedeu, o homem observando a primeira lei da natureza  derivada da Lei natural ( que lhe diz para buscar a paz) e do Direito natural( que dá-nos a liberdade de buscar todos os meios capazes de assegurar a defesa de nós mesmos), chega a seguinte lei: “Que um homem  concorde, quando outros também o façam, e na medida em que tal considere necessário para a paz e para a defesa de si mesmo em renunciar a seu direito a todas as coisas, contentando-se, em relação aos outros homens, com a mesma liberdade que aos outros homens permite em relação a si mesmo.”
-->(Leviatã cap. XIV, p. 78-9.) No entanto esse fundamento jurídico não é suficiente para cessar o estado de guerra, é necessário um Estado poderoso e armado capaz de fazer cumprir tal fundamento.
            Surge então a figura do Estado absoluto, não conhecido na Idade Média, cujos soberanos estavam sujeitos aos parlamentos e a nobreza. Dessa forma a única maneira de garantir esse poder absoluto é um pacto entre todos os homens, onde todos transferem a homem (que não está sujeito ao pacto) toda sua força e poder de forma que este reúna em si todas as vontades e assim, sua vontade e decisão seja a vontade e decisão de todos.  Assim surge o Leviatã, aquele que possui o poder soberano.

            Em Hobbes a igualdade é negativa, homens iguais com direitos iguais entram em conflito, se tornam competidores, inimigos. Portanto é a igualdade o que leva a guerra de todos contra todos. Quanto a Liberdade, Hobbes reduz à possibilidade de locomoção, a capacidade de ir e vir, sem oposição nenhuma, e deixa claro que esta liberdade se aplica tanto aos homens quanto aos animais e mesmo aos seres inanimados, visto que liberdade é apenas a ausência de oposição, a incapacidade de movimento. Para Hobbes um homem livre é aquele que dentro de sua capacidade de fazer não sofre restrição externa de realizar essa sua vontade.
            Segundo Hobbes, os conceitos de liberdade (em sua opinião, falsos) herdados dos pensadores antigos gregos e latinos, levam a estimular os conflitos. Na busca de controlar os governantes geram sangue e violência. Assim Hobbes despe de valor a liberdade como colocada por estes pensadores e coloca sua concepção de “verdadeira liberdade”: A liberdade de se submeter ou não a vontade do soberano. Mas, isso implica em perder todos os benefícios do contrato. Se o soberano deixa de proteger a vida do súdito, este tem toda a liberdade de se rebelar contra o soberano, no entanto isso não implica que outros possam a este se juntar, visto que o soberano não deixou de proteger os outros, a liberdade é individual, apenas ele tem o direito de recuperar a sua liberdade natural e com ela todas as implicações. O soberano não está sujeito ao pacto, portanto ele não comete injustiças.

O Estado de Hobbes, apesar de não ser fundamentado no medo, ainda assim ele se faz presente e desempenha papel relevante. O leviatã não é aterrorizante, pois que o estado de natureza, esse sim é a imagem do terror, visto que não há segurança e nenhuma garantia, o homem vive em estado permanente de vigília e terror, onde nem mesmo nos amigos é possível confiar. No Estado hobbesiano, o que há é um certo temor do soberano, no entanto se o súdito se mantêm dentro das leis, pouco tem ele a temer.
O Estado não é fundado apenas no medo da morte, ele representa uma aspiração a uma vida confortável, e isto se traduz praticamente em propriedade, ou seja, o Estado se funda também nessa perspectiva burguesa de legitimar a propriedade. O súdito passa a ter total controle tanto do uso da terra quanto do fruto que ela produz, e do abuso, visto ter todo o direito de suprimir todos os outros súditos do uso dessa terra, menos o soberano, e é aqui que o pensamento hobbesiano se afasta dos ideais burgueses, pois nega o direito natural a terra e coloca na mão do soberano a responsabilidade por sua distribuição.
A visão científica de Hobbes, quanto à sociedade e à política, são responsáveis, ao lado da concepção de subjugar a religião ao poder do Estado, a negação do direito natural da propriedade, pela sua reputação, juntamente com Maquiavel e Rousseau, de pensador maldito. Hobbes não via no homem um ser naturalmente social, pois se assim fosse o homem não poderia conhecer essa sociabilidade natural, pois que só aquilo que o homem constrói pode por ele ser conhecido, portanto se existe um Estado foi o homem que o fez. É nesses termos que Hobbes concebe o Estado e a Ciência Política.

Manoel N Silva

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

MEU OLHAR AZUL




Azul..meu olhar sempre foi azul...
Não conheço outra cor de me olhar... Nem de olhar!
A primeira paisagem que meus olhos lembram
É de dois lagos de um azul sem fim,
Que me olhavam sob duas lentes claras..
Eram os olhos azuis que me velavam...
Depois era um céu azul, mais claro e menos belo..
Mas, ainda azul, que me cobria de liberdade e tempo...
Depois eu conheci outras cores, e também o azul do mar.
Velas brancas sob o céu azul e sobre o azul do mar...
E o vermelho que me fazia chorar...
Mas, que me brindava com o sorriso branco
Sob o azul dos lagos de me embalar...
E veio o mar, e veio a vontade de navegar...
E era azul o mar e a vontade...
Foi aí que eu conheci o triste azul da despedida...
O azul molhado..brilhante...e fiquei parado..
Me vendo numa distorcida imagem azulada..
Que viajou em duas gotas simétricas,
Do presente ao futuro...e instalou-se no passado....
E nunca mais eu vi aqueles lagos azuis, sem fundo...
Eles moram no ontem...
Eu conheci várias cores e olhares de cores várias,
Amei o verde e o carmim, o rosa e o marrom....
Me vesti de negro nos teus olhos...
E hoje meus olhos se colorem de lembranças,
Porém só sei olhar azul, só sei ver azul...

Manoel Nogueira
Fortaleza, 1985.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

DIÁLOGO VIRTUAL






Yedra
O que é ser místico? Parte inferior do formulário

Cerberus
Bem, no meu entender é buscar respostas fantasiosas para o que nos escapa a compreensão. Ou seja, inventar respostas através de seres, entidades mágicas, poderosas, ou mesmo se valer de teorias improváveis e/ou sem fundamentação no real.

Yedra
Então podemos encaixar alguns filósofos nesta definição? Heráclito era místico?Parte inferior do formulário

Cerberus
Não há como negar que todos os filósofos gregos, apesar de tentarem buscar respostas racionais para explicar o mundo , a natureza e o homem, estavam presos as suas crenças. De uma forma ou de outra eles eram místicos. No entanto é esse movimento de libertação do mito, que diferencia os gregos antigos. No caso de Heráclito, eu diria, que ele estava num estado avançado de libertação do mito, tendo como referência os seus contemporâneos.

Yedra
Sendo que não há muitas maneiras, ou talvez até mesmo nenhuma, de dizer o indizível, podemos dizer que poetas, místicos e amantes usem uma linguagem muito parecida?

Cerberus
Sem dúvida! Não podemos nos furtar da tentativa de explicar. Mas, poetas, amantes e artistas, buscam, contrariamente ao místico, dar conta desse indizível metaforicamente, consciente de sua impossibilidade e irrealidade. O místico não, dogmatiza, realiza a fantasia, concretiza, materializa essa fantasia, e acredita nela como realidade mesma.

Yedra
Mas até que ponto isto faz parte da nossa estrutura mental de buscar pelas causas e explicações?

Cerberus
Tenho comigo que é essa característica o que nos faz racionais. Essa capacidade e necessidade de conhecer, saber por que, como, é a razão em si mesma, sua "essência", sua estrutura mesma.

Yedra
Por que uma forma de conhecimento deveria ser condenada pela forma oposta, com que legitimidade?

Cerberus
Não é uma forma de conhecimento, a meu ver. Veja, por conhecimento eu entendo tudo aquilo que pode ser conhecido por todos os homens e não "revelado" a poucos e nem muito menos dependente de um ente invisível. Por isso separo conhecimento de fé e de arte. Alguns pensadores e estudiosos, colocam fé e arte como conhecimentos e o dividem em três os tipos de conhecimento: Religioso, artístico e racional.

Eu não. Penso a divisão da percepção humana em: conhecimento, fé e arte. Sendo que os dois últimos não se propõem a universalidade e portanto são de cunho particular, acidental. Conhecimento mesmo só aquele que posso comunicar a todos e todos podem acessar universalmente.

Yedra
Somente a Razão pode nos dar acesso às compreensões aproximadas da realidade? Parte inferior do formulário

Cerberus 
Não, mas apenas o conhecimento pode nos fazer compartilhar tais compreensões.

Yedra
Pois eu não considero legítima esta pretensão "iluminista" de conferir somente à Razão o poder de dar a última palavra em matéria de conhecimento, desmerecendo as outras modalidades, que também correspondem a uma tentativa válida de dar sentido à realidade. Dada à diversidade humana bem como a necessidade individual de cada qual particularizar sua visão de mundo, penso que pretender promover uniformizações cognitivas é arbitrário. O grande poder que foi posto no racionalismo estrito, não conseguiu fazer do mundo algo totalmente inteligível universalmente. E nem poderia. Não há como substituir tradições, costumes e crenças de forma pretensiosamente dogmatizante.Parte inferior do formulário

Cerberus 
Mas, é unicamente pelo conhecimento racional que podemos universalizar e compartilhar uma realidade empírica, material.

Não é uma questão de subordinar a arte e a fé à razão, mas de deixá-las no seu devido lugar, que é  a particularidade. Não podemos tornar uma crença, uma particularidade cultural em conhecimento universal, podemos sim, aceitar como isso que é: particular, pessoal, cultural.

Se formos tomar como conhecimento a fé é necessário particularizar o mundo e fragmentar a humanidade, e assim, viabilizar o relativismo, aceitando que cada religião, cultura, crença pode agir conforme seus valores, em detrimento do homem, da humanidade.

Você concorda que assim seja? Eu não...!

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

DIREITO INDIVIDUAL, LIBERDADE E PROPRIEDADE PRIVADA NOS DIAS ATUAIS, À LUZ DA DIALÉTICA HEGELIANA.




O Direito abstrato é a esfera da objetivação e efetivação da vontade livre. Não dessa vontade enquanto escolha, e sim da vontade livre que se tem a si mesma na sua universalidade. A liberdade em si e por si, concebida como unidade de inteligência e de vontade racional e universal se objetiva e segue no caminho de sua efetivação no mundo. Não se restringe nem à sua validade normativa como ordenamento jurídico, nem às instituições da sua aplicação jurisdicional, pois ele é a efetivação da liberdade objetivada, é a liberdade enquanto Ideia.
O Direito Abstrato é “abstrato” em vários sentidos. Primeiro, porque Hegel enuncia e desenvolve somente os princípios e conceitos fundamentais do moderno direito privado, mas considerado independente da sua positivação no Estado e da sua aplicação Jurídica; segundo porque, embora tenha uma efetividade imediata, a liberdade é apenas exigida. É abstrato no sentido de que nele a liberdade é efetiva de maneira somente imediata e por fim, porque o seu princípio fundamental é a personalidade e que só tem consciência da sua liberdade enquanto universalidade formal.
O direito, a ética, a realidade do direito, são formas que se apreendem com o pensamento. A lei, até certo ponto, tem identificação com os componentes da comunidade. Hegel afirmava que a filosofia devia ser, de forma predominante, o princípio móvel da aplicação do direito e das leis. Segundo ele, os Estados suprimidos deste principio se tornariam superficiais no que diz respeito à ética, o direito e o dever. O Estado começaria a se dissolver, e a consciência justa, do direito e da justiça entre os particulares, assim como a destruição da ordem pública e as leis do Estado.
Para Hegel o primeiro momento é o direito pessoal, o individuo toma consciência de sua liberdade como sendo exteriorização do espírito livre. Ou seja, a posse, a propriedade.
A base dos direitos individuais reside na propriedade. A propriedade não é meramente material, a aquisição é fundamental para a afirmação de um indivíduo de identidade e personalidade. A propriedade é uma expressão de si e da afirmação de um indivíduo de direitos, uma vez que é através da propriedade que se pode dizer "isto é meu", uma reivindicação que respeita os outros. A propriedade é a personificação "da personalidade", diz Hegel.
O sistema de propriedade privada estabelece a individualidade e a personalidade através de contrato de câmbio. O Contrato estabelece normas institucionalizadas de propriedade através do respeito mútuo dos direitos e obrigações. A vida econômica é regida pela livre troca de mercadorias. É baseado em um conceito institucionalizado do indivíduo como tendo alguma reivindicação de reconhecimento como um direito de pessoa. Se um mercado de câmbio está a funcionar de forma eficiente, os agentes econômicos devem reconhecer padrões universais, através da qual uma pessoa pode reivindicar a propriedade. As normas estabelecidas de reconhecimento recíproco na esfera econômica moderna são internalizadas em atores econômicos e representam uma "vontade comum".
O conceito de direitos individuais a que esta vontade comum dá o seu parecer favorável é um conceito abstrato. O indivíduo que implica é um indivíduo universal, sem traços particulares e sem referência ao ambiente social ou cultural. Assim, os direitos estabelecidos pela propriedade privada e de câmbio são "direitos abstratos" e envolve os indivíduos como resumo nos temas universais.
Partindo dessa visão hegeliana do direito ideal e da propriedade privada, assim como da importância da mesma para fundamentar os direitos individuais, me parece que de lá para cá, passando pela tentativa marxiana de dar realidade ao direito e por todas as tentativas dos marxistas, não conseguimos objetivar essa liberdade e continuamos no mesmo patamar da crítica hegeliana e pelo andar da carruagem não conseguirá nunca conciliar direito e propriedade privada.
Hegel propõe a que esse direito se torna realidade quando passa da moralidade (A moralidade é essencialmente o lado subjetivo das obrigações recíprocas sociais institucionalizadas nos contratos e no mercado econômico. Indivíduos experimentam tais obrigações recíprocas como uma obrigação moral de respeitar os direitos universais.) para a eticidade (Constitui o momento em que a liberdade torna-se realidade. É a moralidade palpável, acima da opinião e da boa vontade, fortalecendo as leis e as instituições. É a totalidade de determinações morais da família, da sociedade civil e do Estado, incidindo (aparecendo) entre seus membros – existência, manifestação e realidade. Assim dizendo, fica expressa no caráter do indivíduo – probidade, honradez, integridade e honestidade.)
Eu, particularmente vejo puro idealismo, e com as adaptações de Marx e dos marxistas, mesmo assim, essa ideia de objetivar o direito a todos suprimindo a propriedade privada é impossível. A pretensão hegeliana ou a utopia materialista não me parecem ter avançado um só milímetro, e, toda a filosofia contemporânea se remexe desesperada nesta areia movediça do relativismo.
 Como vamos reconstituir a família se, cada vez mais, as sociedades se voltam para o macro, para a mega corporação?
A sociedade já não é mais composta de conjuntos de células, ela caminha para se tornar uma massa uniforme, padronizada, sem vínculos privados, pessoais, onde todos os sentimentos serão reflexos dessa mega corporação social.
Não existem linhas de fuga, possibilidades de escape, os muros cada vez estão mais altos e os condomínios que se multiplicam e se expandem e já aparecem, nas classes mais altas, tal qual cidades, e até nas favelas já se manifesta esse tipo de moradia coletiva.
Além disso, atuam aí a ideologia política, religiosa e econômica, toda diversidade se ajusta aos modelos ideológicos, essa mediação é feita sob a forma de modelos que aparentemente atendem e, por isso, agregam e conformam essa diversidade, reduzindo-as a meras manifestações de consumo, credo e preferências políticas, que na realidade não tem nenhum resultado, a não ser a homogeneização da sociedade, visto que toda diversidade se dilui nestas atividades inócuas!
Não há existe mais núcleo familiar, apenas uma célula econômico-social, parte de uma corporação, onde são gerados e criados os novos componentes, os diversos operários que fazem moverem-se os mecanismos de sustentação dessa massa uniforme, onde a diversidade subjetiva, a liberdade e a revolta, são pura idealização e se manifestam como disse antes, em atividades nulas. Não encontramos mais o Casal, visto que a ideia vendida e consumida não é duas pessoas que se relacionam emocionalmente com vista a formar “um”. Essa ideia de união, complementação, foi substituída pelo modelo mais produtivo para o sistema, que são indivíduos com espaços distintos, tanto quanto os filhos, que já não se reportam a pai e mãe e sim ao Estado, pois é ele que regulamenta e conduz a educação das crianças, não existe mais educação familiar.
É, realmente a luta é pura abstração, se dá no meio virtual e não atinge o real. Quanto a nossa natureza nômade e criativa, há muito se recolheu aos confortáveis sofás, ou mesmo às humildes cadeiras de plástico, diante do grande legislador: a mídia televisiva!
Como resistir ao discurso se arte de hoje é mera realidade, cotidiano colocado em holofotes, recortado, separado, mas, ainda assim mero recorte da realidade?
A ciência se fez arauto do discurso e busca apenas realizá-lo e a filosofia é vazia de ações, está sempre na janela a observar o mundo e sua única ação é analisá-lo!
Parece que o homem perdeu o poder de observação e análise e, é só ator nessa sociedade... Não vejo o movimento, ao qual se refere a dialética hegeliana, cujo ápice são momentos da unidade em que não só não estão em conflito, mas, onde tanto um quanto o outro é necessário; e essa igual necessidade faz a vida do conjunto. Ou seja, movimento, relações continuas de opostos!
Parece haver uma conformação, que a humanidade aceitou resignada o que está posto. Mas, o que percebo é que não há resignação, é que essa é a única realidade possível, lógica, natural, histórica e espiritual que podemos viver, e não será a revolta, a indignação (que eu chamo de estado de consciência plena de sua realidade) que modificará os caminhos da humanidade. Pois que essa mesma revolta e indignação são apenas momentos dessa síntese...!
Não temos que levantar da poltrona ou descer da janela, temos que está sempre nesses três momentos, ambos são a mesma posição, é o movimento, o ponto de síntese, a ação. Devemos que ser observador, leitor e ator do mundo.
A meu ver, ainda estamos no direito abstrato e a única efetivação que houve foi a da propriedade privada. Base hoje te todos os sistemas políticos e econômicos do mundo.
Não é por Hegel ser metafísico e idealista (segundo seus críticos) que o seu sistema não sirva de base (Marx que o diga...) e ao mesmo tempo se preste à críticas. Apesar da pretensão hegeliana e o seu absoluto, seu sistema é bem coerente, lógico e consistente, o problema é exatamente esse momento, essa síntese que forja uma eticidade muito longe da realidade humana, dos conflitos sociais reais. Quando olho a sociedade, vejo um todo interdependente, complexo e contraditório entre as múltiplas partes que o formam.
Eu poderia aqui fazer um interminável discurso, cheio de conceitos e mais conceitos acerca do que são o direito individual e a propriedade privada, mas, estaria apenas repetindo o que muitos já disseram e o que todos, que tenham o mínimo de discernimento, intuem e/ou sentem, na própria pele quando da falta e o excesso de ambos. Portanto, limito-me ao problema fundamental que é exatamente esse meio termo, esse caminho aristotélico que permeia todo o pensamento político, social e filosófico, até os dias atuais, sem, no entanto, mesmo sendo o alvo principal dos pensadores, encontrar uma solução que seja aplicável a realidade.
Diante disso, seria muita pretensão minha acreditar que sou capaz de dar essa solução, mesmo porque não acredito que tenha uma solução para esta contradição, no máximo podemos compreender essa contradição e tentar positivá-la, amenizando os efeitos negativos que resultam desse conflito.
Não posso afirmar se existiu um estado de natureza e se o homem natural era bom ou mal, como colocam os contratualistas, ou se o homem possui uma essência como nos afirmam os idealistas em geral, mas, concordo com os que dizem, sejam idealistas ou materialistas que a origem de todo conflito se deva a propriedade, a posse, a privatização do bem que deveria ser comum e, que de modo algum se possa conciliar, sem injustiças, direito individual, liberdade e propriedade privada.
Daí, minha única proposta é uma compreensão profunda deste conflito e busca, dentro dele mesmo, nas suas partes, do melhor movimento contraditório, no sentido de equilibrar positivamente os efeitos dessa relação contraditória e conflitante, na sociedade. Seria o quarto momento dessa dialética (e, é aqui que entra a base hegeliana a qual me referi para enunciar este tópico), esse quarto momento que é uma constante no sistema de Hegel, que diferencia a sua dialética e lhe caracteriza o movimento constante, ascendente, que sempre transforma síntese em nova tese.

Manoel N Silva