quarta-feira, 13 de abril de 2016

CRÔNICA DO ABSURDO





Desde muito cedo aprendi a questionar valores e regras, não tive uma formação religiosa marcante, capaz de imprimir em mim, marcas profundas ou me fazer ter uma crença cega, inquestionável. Aliás, ao contrário, não tenho crenças. Pauto minha caminhada nesse mundo, respeitando as leis e as forças naturais. Adoto como norte a premissa de que o ser humano deve ser o guia de si mesmo.
Não, não é uma crença moderna ou um humanismo pós-moderno e, nem muito menos um materialismo contemporâneo. Não tenho uma fé inabalável na ciência e na razão humana. Mas é uma caminhada lúcida, coerente, dentro das possibilidades humanas, sem delírios esotéricos ou científicos. Não vivo uma ficção e nem um romance, vivo a crônica da vida como ela se me apresenta, sem deuses com poderes fantásticos e sem milagres científicos.
Tenho o homem como referência e molde, não atribuo a nós, seres humanos, nenhuma essência ou substância eterna, inata, somos fruto de nossas experiências e desejos. E, como tal, somos falhos, egoístas, interesseiros e tendemos sempre, como diria Agostinho de Hipona, para o mal.
Sim, cito aqui um religioso, mas, um religioso que se converteu, que se disse “iluminado” por uma graça divina. Ele não nasceu pleno de fé.  Antes, como eu, Agostinho questionava as regras e os valores que lhe permeavam o entorno e talvez, como eu, tenha sofrido ao se deparar com a constatação de que a vida é realmente sem sentido, que não haveria aquela referência perfeita e nem a essência divina que lhe faria mover-se para um destino já traçado e escrito, como afirmava sua mãe.
No entanto, é justamente aí que aparece a grande diferença que me afasta dele, ele tem uma influência religiosa forte, firme, sufocante e, o determinante em sua trajetória, a super protetora Mônica, sua incansável mãe, que lhe azucrina noite e dia com o apelo da fé. Frágil em suas convicções, e também em suas emoções e determinações, Agostinho deseja sentido, precisa disso e sucumbe, abraçando cegamente a fé de sua mãe.
Mas, deixando de lado essas elucubrações filosóficas e meditativas, o que realmente quero dizer é que, olhando ao meu redor, me vem um rascunho de uma crônica que me faz tremer, e não é trocadilho, o fundamentalismo religioso de grande parte das autoridades constituídas, a fragilidade emocional e intelectual da maioria das pessoas, uma imprensa comprometida com uma parcela privilegiada da população que detém a maior parte do poder econômico dessa nação, instituições viciadas e demagogas que se valem de retóricos discursos moralistas, para justificar atos e ações ilegais, autoridades das mais altas posições que se mostram,  notoriamente corruptas, rabiscam a minha frente, esta crônica  dantesca, que mais se assemelha a uma obra de Kafka ou Camus!


Manoel Nogueira

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