sábado, 9 de março de 2019

O CHAPELEIRO LOUCO




                Começo essa reflexão entre percepções confusas, apreensões difusas, irracionais. Quisera a lucidez das certezas políticas e econômicas que sempre tive em tempos anteriores. Quisera, mesmo que no crivo dos censores e diante das amarras da ditadura, a clara visão do inimigo, o conhecimento de seus objetivos, a consciência de suas armas e suas ambições. Ou, em tempos de liberdade, as tendências e interesses no tabuleiro do jogo político, onde cada peça tem seus movimentos declarados, cada jogador tem seu objetivo definido e as regras são do conhecimento e alcance de todos. Hoje me sinto Alice no tabuleiro da Rainha de Copas, as regras são quebradas sem punição e os jogadores adversários são meras cartas de um baralho viciado, cujo dono ninguém sabe, ninguém viu!
            Olho ao redor na tentativa de entender quem manda! Quem decide os destinos de mais de duzentos milhões de brasileiros? A quem entregamos nossas vidas e nossos desejos de nação? Como fomos tão ingênuos e tão tolos?
            As perguntas aqui formuladas, na realidade são mera retórica, sabemos que não há culpados e nem inocentes, não somos tolos e nem ingênuos, nossa sociedade é isso que hoje nos governa. Não houve enganos! Em cada cidadão de bem, em cada pai de família, em cada crente, reside um Bolsonaro, ou parte dele. Essa incerteza é fruto da diversidade de sentimentos e desejos que levaram esse protótipo de ditador,  fantoche  ou mero espelho social, ao cargo de presidente.
            Até aí, tudo bem! Mas, o que me intriga e me desespera é que ele não se definiu governante e nem definiu quem governa! Ele é uma incógnita, uma fábrica de contradições e ações desencontradas. Seus aliados batem cabeça, se desculpam e desculpam-se, desdizem-se e não se definem. Não sabemos quem governa e, me parece, nem eles.  O governo reflete em sua constituição a mesma disparidade de seus eleitores, de um lado temos o grupo militar que até agora não disseram a que vieram, se são a espinha dorsal desse governo ou se meros acessórios; de outro lado temos o núcleo político que  se equilibram entre os processos e investigações e o trânsito no parlamento; já os super ministros da Justiça e da Economia estão de mãos atadas e reféns das suas histórias, calados, cabisbaixos e sem força real; se não bastasse, temos ainda o núcleo psicodélico, surreal, pirotécnico que só falam e fazem besteiras e asneiras.
No âmbito do legislativo a coisa se repete, se de um lado temos no congresso uma maioria conservadora e afeita a pautas liberais, o partido de Bolsonaro e outros mais a direita, trouxeram um punhado de apolíticos, parlamentares que não aceitam o jogo dos discursos e das alianças, dos acordos e dos conchavos, acreditam eles que na politica tenha que prevalecer o “certo”, não entendem que a política é o campo das disputas verbais e que nem sempre vence quem tem a verdade e sim quem tem a palavra, o verbo.
No campo do Judiciário, a campanha politica, os privilégios e os erros da Lava-jato, colocaram os juízes e os tribunais de calça curta, reféns de seus atos impróprios e nada éticos, embora legais, não tem a força moral para ganhar a confiança do brasileiro. O STF virou piada e a Lava-Jato sinônimo de abuso de poder.
No lado social e corporativo, temos as mesmas incertezas, centrais sindicais não se definem enquanto oposição ou situação, setores organizados da sociedade não se colocam claramente diante da situação. OAB, CNBB, FIESP se fazem de mortas...
Apear de tudo que aqui expus, infelizmente não consegui chegar a uma conclusão clara, definitiva, que pudesse satisfazer minha mente e acalmar a inquietude do meu ser. Termino essa reflexão sem respostas e com a sensação de que continuo na história de Lewis Carrol, e que não sei se o presidente do meu país é um rei de copas, um chapeleiro maluco ou um sapo-lacaio, e que eu  não terei a sorte de uma irmã me acordar para um chá da tarde...

Manoel N Silva

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